26/05/2020
Batalhão de Caçadores 1899
A nossa partida para Moçambique foi em 4 de fevereiro de 1967 no cais de Alcântara.
Viajámos no “velho Niassa ”.
Foi uma cerimónia emocionante.
O navio estava todo inclinado a bombordo porque cerca de dois mil militares se aproximavam da amurada do navio para se despedirem das famílias.
Havia choros gritos e desmaios.
A guarda de honra foi feita por militares da polícia do exército que abriram alas ao longo do cais e se perfilaram em continência.
Foi dada ordem de partida e o navio começou a aquecer os motores e a deslizar lentamente.
Os nossos familiares acenavam com lenços brancos e gritavam palavras que já não se percebiam.
Os nossos olhos distraíram-se com algumas lágrimas pensativas.
Embarcaram connosco vários oficiais, de alta patente, que deram os seus discursos muito “patrióticos”.
Para nós aquele que mais nos tocou foi o discurso do nosso 2º Comandante, Fernando Reis Caldeira, quando defendeu a ideia de que os militares não iam para a guerra com as populações de Moçambique, mas sim defender populações indefesas de Moçambique que queriam continuar uma vida calma nas suas machambas com as suas famílias.
Era um discurso diferente daqueles que entendiam que os militares tinham de estar preparados para dar cambalhota em frente e tiros de rajada ao primeiro sinal de presença do inimigo no mato.
De repente, o navio abrandou a marcha e parou mesmo.
Durante mais de 30 minutos estivemos à espera e muito apreensivos.
Havia boatos no ar de que iríamos voltar para trás.
Ficámos espantados quando vimos que os Suas Excelências, os tais dos discursos empolgados, tinham saído todos em Cascais, numa fragata da Marinha de guerra.
E nós lá fomos, mar fora durante vinte e nove dias, que mais pareceram anos.
A viagem foi o maior sacrifício que tivemos de enfrentar.
O navio Niassa, segundo diziam os cozinheiros, era o único navio português em que os tachos não precisavam de ser atados, apesar de não possuir grandes condições para transporte de passageiros chegava a transportar mais de 2000 passageiros, embora a sua lotação fosse de 400 passageiros incluindo a tripulação.
Era um navio de grande estabilidade devido ao seu lastro constituído por passageiros e carga.
Nele viajavam batalhões de militares em condições deploráveis.
Os soldados eram os que mais sofriam durante a viagem, pois que tinham de dormir no porão, com um cheiro nauseabundo, em péssimas condições de higiene e salubridade.
Tudo isto contribuía para que aparecessem as febres, as gastroenterites e as intoxicações alimentares.
Os enjoos eram frequentes e daí a agonias e os vómitos.
Os graduados, com um pouco de melhor sorte, dormiam nos camarotes.
No entanto, apesar das poucas vezes que se deslocavam ao porão não eram indiferentes á situação que se vivia e muitas vezes tinham de recorrer ao “Dr. Charneca” pedir mais umas pastilhas para o enjoo.
O navio Niassa fez escala em Luanda, Lourenço Marques, Nacala, Porto Amélia e Mocímboa.
Chegámos a Mocímboa da praia a 05 de Março de 1967.
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