segunda-feira, 31 de março de 2014

Memória Fotográfica da Guerra em Moçambique, por Ricardo Quintino

Memória Fotográfica da Guerra em Moçambique

A todos os que viveram a guerra em Moçambique, aconselho que vejam as imagens constantes do vídeo, que aqui vos deixo abaixo:



Por Ricardo Quintino

domingo, 30 de março de 2014

Para que não se perca a memoria, por Luís Leote


Luís Leote

In TerraWeb‎
 

"Para que não se perca a memória."

Deixo, pois, aqui relatados, não 26 meses de permanência em terras do Norte de Moçambique, mas, principalmente, cerca de 9 meses, "vividos" na Serra do Mapé, algures no distrito de Cabo Delgado (lá para os lados das "Terras Sagradas" da etnia Maconde), designadas, à data, pelos "entendidos" nas lides da guerra, por "Terra de Ninguém".
 
 

  ... Eram cento e poucos "bons rapazes", quase todos eles oriundos das belas terras transmontanas, trabalhadores braçais, na sua maioria, ignorantes em política, como quase todos nós, "Doutores" em amizade, "Irmãos" em camaradagem, resumindo, como era uso dizer-se, "carne para canhão". Pioneiros que foram na "conquista" da Serra "acomodaram-se", em vésperas de um Natal, em 4 buracos escavados no chão, com as próprias mãos e os parcos meios de que dispunham.

Em cada um desses buracos, amontoaram-se uma trintena de homens, armas, munições e pouco mais, para além das inseparáveis e "amistosas" rações de combate e algumas grades de cerveja.

Rodeados de algum arame farpado e de umas "trincheiras", feitas à pressa, com a selva a 50 metros, estavam "prontos e determinados" a defender aquele "pedaço de Portugal" (pouco maior que um campo de futebol) ironicamente chamado "Pousada da Serra do Mapé".
 
Cruzamento para Cruz Alta (Serra Mapé)

Bastaram cerca de 2 semanas, após a "tomada do objetivo", para que, num já esperado raiar do sol, toda a serra "acordasse", estrondosamente, ao som das morteiradas, das "bazucadas", das canhonadas e do sibilar das incontáveis "7.62" disparadas pelas sobejamente conhecidas armas de assalto, as "KALASH", entre outras.

AK 47 - Kalashnikov
 
Bastou a "eternidade" de duas horas, para que 7 dos "bons rapazes", os tais que bebiam cerveja e comiam as rações de combate (por nada mais haver, a não ser o capim), deixassem de o fazer para sempre, enquanto outros, mais de uma dezena e meia, algumas horas depois, conseguissem ser evacuados para o "hospital" de Mueda, com graves ferimentos e mutilações para o resto da vida.



   Testemunho de um Furriel Mil° 1968-1970

Nota: A Companhia que fomos render na Serra do Mapé.

domingo, 2 de março de 2014

Na Picada Macomia-Chai a cotação da vida era alta, por Luís Leote


Autor: José Leitão

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Memórias ... in TerraWeb
"para que não se esqueça a memória"

Na Picada Macomia-Chai a cotação da vida era alta.
Nem toda a gente tinha direito a ela....
As minas, seguidas de emboscadas eram uma constante.
Mesmo com a picada quase totalmente alcatroada, o que dificultava a deteção das minas, que eram colocadas com tal perícia pelo IN, o que nos levou a substituir as 'picas" por vassouras.
O desgaste dos soldados eram grande, pois com um sol escaldante e a lentidão da progressão, causavam grande sofrimento, quer físico, quer mental.
A meio do percurso encontrava-mos o Monte das Oliveiras, onde uma Companhia de Artilharia...."habitava" em condições muito precárias.
Eram uns heróis, os que restavam, pois as baixas já eram grandes, ao ponto da 2763, estar reduzida a cerca de meia centena de homens.
O Capitão tinha desertado!!!
Monte dos Oliveiras

Mas éramos sempre recebidos com grande alegria.
Tínhamos conhecimento de que o IN, aproveitando alguma desorientação, colocava minas com fornilhos, que iam destruindo as rebenta-minas e até camionetas da Empresa Civil, que procedia ao alcatroamento.
As crateras das minas anticarro eram bem visíveis, para mim enquanto tiro a foto de cima dos sacos de areia colocados na "rebenta-minas"!!!
Olhamos pela picada fora, apreensivos.
Abraço a G3 e ....o Chai ainda fica a 2 horas de picagem.
O soldado Gouveia com o seu olhar de lince, deteta à distância uma mancha de óleo no alcatrão.
Ao seu sinal a coluna para e salta dos Unimogs, tomando as devidas precauções.
A mata é varrida com rajadas, das G3 e o Mendes manda umas "basucadas", quer para a direita quer para a esquerda, não vá o "diabo tecê-las"!!!
O Furriel especialista em minas e armadilhas avança.
Confirma a mina anticarro, com cordão detonante.
Faz um sinal, para que todos se afastem cerca de 100 metros.
Olha o chão... com ar apreensivo!
Prepara a detonação... e afasta-se rapidamente.
Foto de Fernando Lourenço.
O estrondo é medonho.
Um cogumelo de fogo se eleva aos céus.
A cratera é enorme!!!
Grande Gouveia!!!
Safaste-nos de boa!
Mais à frente ainda se vislumbra a vegetação queimada, alguns pedaços de camuflados e uma bota, pendurada num embondeiro.
Meses antes 9 heróis de uma Companha sediada no Monte das Oliveiras, tinham subido literalmente aos céus. 

Mas agora não há perigo.
Avançamos!!!
A chegada ao Chai...foi festejada...com umas fresquinhas Laurentinas!
O soldado Gouveia é abraçado por toda malta!!!

A morte continua a ser adiada!!!


JOSÉ LEITÃO