quinta-feira, 9 de maio de 2019

Cá vou andando..., por José Nobre



José Nobre 
2019/05/09

Cá Vou Andando.
A propósito de - Nunca Atirei Pedras Aos Cães.
A guerra do ultramar. 
A minha foi em Moçambique.



Nada sei, nada,ou quase nada, das outras guerras. 
O que escrevo aqui no FB, foi vivido por mim e mais cento e setenta gajos.
Tento falar de todos,com respeito e algum carinho.

Nas minhas vivências em África, não existem heróis, porque não os conheci, porque não os vi.
Convivi com gente, cujo único desejo era voltarem vivos e sem mazelas. 
Tentávamos todos salvar a pele, mesmo que para tal,fosse necessário matar.


Existem na Internet, dezenas e dezenas de blogues, que falam da guerra ultramarina.
Alguns com fotos e personagens que nada têm a ver com a guerra,a nossa guerra. 
Se conheci heróis, foram heróis improváveis, como por exemplo um enfermeiro que ajudou ao nascimento da várias crianças(negras),em vários sítios por onde passou.

A guerra só existiu, para todos aqueles que tinham uma graduação até capitão, os outros, todos os outros,não fizeram a guerra, viveram da guerra e do estatuto que a mesma proporcionava.
Vejo fotos de altas patentes,de Coronéis, de Tenentes Coronéis, fotos dos tais que nunca "fizeram o mato", com o peito cheio de medalhas, mas sem nunca terem provado o sabor de uma Ração de Combate,( no mato) sem nunca terem sentido o frio do medo, o silvar de uma bala, o rebentamento de uma mina. 
Esses,que aparecem sempre no dia do Combatente, para colocar mais uma coroa de flores, num qualquer monumento aos mortos do ultramar, numa qualquer localidade de Portugal.

" A guerra não foi só aquilo que escreves." 
Pois não, mas também foi.
É o que eu chamo de... o lado humano da guerra,como se fosse possível existir humanidade num conflito armado.

As armas que me foram entregues, não me transformaram em herói, nem a G3, nem as granadas, nem os carregadores cheios de balas, nem o camuflado.
Era unicamente um gajo que não queria "lerpar".
Consegui, apesar das emboscadas, apesar das minas, apesar das picadas para Mueda, para Muidumbe,para Nangade, para Cassacatiza. 
Outros, não sobreviveram. 
É para eles, para todos eles, que vou escrevendo as minhas "merdas."

A Pátria, deu-nos uma farda, uma arma, uma ideologia, uma história para salvar.......depois deixou-nos num caís qualquer de Lisboa, como mercadoria fora de prazo. 
A Pátria que nem os mortos sabe HONRAR...aqueles que já nada lhe pedem, mas que lhe entregaram a VIDA de ....MÃO BEIJADA...com o respeito que a CHAMADA ....PÁTRIA ....lhes merecia.

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